domingo, 19 de maio de 2013

Rio de Janeiro fere direitos humanos em preparação para Copa


O Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro lançou na quarta-feira (15) a segunda edição do dossiê “Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de Janeiro”. A Pública teve acesso ao documento e traz alguns dos principais pontos dele (baixe aqui ).
O relatório das violações de direitos humanos divide-se em oito esferas ligadas ao interesse público: moradia, mobilidade, trabalho, esporte, meio ambiente, segurança pública, informação e participação e orçamento e finanças. Confira abaixo alguns pontos levantados pelo Comitê em cada uma delas.
Moradia
Nada menos do que 3 mil famílias residentes na cidade do Rio de Janeiro já foram removidas por conta da realização de projetos direta ou indiretamente ligados à Copa do Mundo e às Olimpíadas. O número pode chegar a quase 11 mil famílias expulsas, já que outras 7.800 famílias correm o risco de despejo. Em relação ao primeiro dossiê, nessa segunda versão foram reunidas informações mais específicas e atualizadas de modo a demonstrar detalhadamente as violações de direitos humanos ocorridas na cidade.
As comunidades envolvidas no processo de remoção foram divididas em quatro eixos específicos relacionados ao fator de risco: as obras viárias em curso no Rio de Janeiro; as obras de instalação e reforma de equipamentos esportivos; as obras de revitalização turística da zona portuária e as áreas de risco ou interesse ambiental.
Apesar da especificidade e das peculiaridades de cada região, o dossiê aponta padrões no trato do poder público, sobretudo o municipal, com as comunidades que se vêem envolvidas no contexto de remoção. Esses são seis, presentes na ação do poder público no trato com as comunidades atingidas, segundo o comitê:
“(i) Completa ausência, ou precariedade de informação para as comunidades, acompanhada de procedimentos de pressão e coação, forçando os moradores a aceitarem as ofertas da prefeitura do Rio. Cabe frisar que as comunidades visitadas, sem exceção, não tivera acesso aos projetos de urbanização em suas áreas de moradia.
(ii) Completa ausência, ou precariedade de envolvimento das comunidades na discussão dos projetos de reurbanização promovidos pela prefeitura, bem como das possíveis alternativas para os casos onde são indicadas remoções.
(iii) As indenizações oferecidas são incapazes de garantir o acesso a outro imóvel situado na vizinhança próxima, tendo em vista que a prefeitura só indeniza o valor das benfeitorias e não a posse da terra, fato em geral agravado pela valorização imobiliária decorrente dos investimentos realizados pelo poder público. Tal situação não é revertida nem mesmo com o instrumento da compra assistida, o que gera um aumento no valor pago pelas indenizações em torno de 40%., mesmo assim insuficiente para a aquisição de um imóvel na mesma localidade. Resta a opção de transferência para um imóvel distante, nos conjuntos habitacionais que estão sendo construídos em geral na zona oeste, no âmbito do programa Minha Casa Minha Vida.
(iv) Deslegitimação das organizações comunitárias com agentes dos processos de negociação, sempre individualizados por famílias, buscando enfraquecer a capacidade de negociação dos atingidos com o poder público.
(v) Desrespeito à cidadania através de ameaças, pressão e coação.
(vi) Utilização da Justiça como ferramenta contra o cidadão. Nas ações judiciais promovidas pela procuradoria do município, o poder público tem sido “uma máquina irresponsável de despejos”, sem compromisso com a saúde e a vida das pessoas. “A prática da procuradoria do município parece ser a de castigar todos os cidadãos que recorrem à justiça para proteger os seus direitos.”
Uma comunidade que passou por um processo emblemático de remoção foi a Comunidade do Campinho. Segundo o Comitê, o primeiro contato da administração municipal com os moradores foi em janeiro de 2011. Cinco meses depois a comunidade já estava extinta. O motivo? A construção de um mergulhão do corredor Transcarioca de BRT. O dossiê afirma que houve pressão psicológica para que os moradores aceitassem um apartamento do Minha Casa Minha Vida em Cosmos, a 60 km do local. “Há relatos, com mais de uma testemunha, do recebimento de indenizações em sacos de dinheiro pagos em negociação direta com a empreiteira responsável pela obra”, diz o dossiê.
Mobilidade urbana para quem?
É essa pergunta que faz o dossiê ao tratar das intervenções de mobilidade urbana que estão em curso por conta dos megaeventos no Rio de Janeiro. “A análise dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro indica que estes não estão voltados para o atendimento das áreas mais necessitadas e que apresentam os piores indicadores de mobilidade. Pior do que uma infraestrutura mal construída ou mal distribuída pelo território da cidade, constata-se que muitas comunidades têm sido removidas compulsoriamente ou sofrido ameaça de remoções por conta da construção da infraestrutura de transporte para Copa e Olimpíadas. Isto, por si só, constitui uma violação ao direito à moradia garantido em diversos tratados internacionais”, afirma.
Ou seja, além dos investimentos em mobilidade urbana beneficiarem as áreas que já contam com as melhores alternativas nesse aspecto, a população carente tem que lidar com o ônus das remoções.
“Através das propagandas oficiais e da mídia em geral, o poder público tem prometido uma ‘revolução nos transportes’, construindo as vias Transcarioca, Transolímpica e Transoeste (todas BRTs), e o metrô Lagoa-Barra (alongamento da linha 1) – todos ligados à realização da Copa e dos Jogos olímpicos. Por outro lado, a população clama por serviços de transporte de massa em outras direções e para outras regiões da cidade. Ou seja, enquanto hoje o serviço de transporte coletivo oferecido à população se configura como caro, precário e insuficiente para a demanda existente, o cenário que se desenha para o futuro é o de investimentos em transporte que, ao invés de atenderem à demanda existente, tornam possível a ocupação de áreas vazias ou pouco densas, visando e promovendo a valorização imobiliária e a expansão irracional da malha urbana”, analisa o documento do Comitê Popular. O dossiê também aponta para uma forte concentração dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro, em detrimento das outras 20 cidades que compõe a área metropolitana da capital; dentro da capital, os investimentos estão maciçamente direcionados à Barra da Tijuca e à zona sul, as áreas mais nobres do Rio.
Destaca-se também os constantes aumentos das tarifas de transporte.
Trabalho
Tido como um dos grandes fatores legitimadores da realização dos megaeventos, o impacto da Copa e das Olimpíadas no trabalho é analisado pelo dossiê do Comitê Popular.
O primeiro aspecto apontado pelo comitê é que nas obras ligadas aos megaeventos é comum ocorrer a chamada precarização do trabalho. Prazos exíguos, omissão de fiscalização pelos órgãos públicos competentes, o contexto de exceção que permite licitações feitas a toque de caixa, além das pressões exercidas por órgãos como o COI e a FIFA ajudam a criar este cenário. Só o Maracanã, aponta o dossiê, já passou por duas paralisações relacionadas a condições de trabalho.
A repressão ao comércio informal também se agravou no contexto dos megaeventos, afirma o Comitê. Segundo documento da Streetnet International, articulação de coletivos de vendedores informais de todo o planeta, há 60 mil vendedores ambulantes trabalhando no Rio de Janeiro em risco por conta da realização dos jogos. Os ambulantes não poderão se beneficiar do contexto da Copa e das Olimpíadas, uma vez que estão proibidos de trabalharem próximos aos locais vinculados às competições. “Também está prevista a repressão, com prisão e apreensão de mercadorias, de qualquer pessoa que comercialize material que faça referência aos símbolos dos eventos e de seus patrocinadores. Nessa mesma direção, está proibida a venda de qualquer souvenir dos eventos aos turistas produzido pelos trabalhadores informais. Ou seja, só poderão vender mercadorias com símbolos dos eventos as empresas licenciadas pela FIFA e pelo COI”, diz o texto. Isto está inclusive garantido pelo artigo 11 da Lei Geral da Copa (12.663/2012).
Esporte
“O futebol no Brasil está vivendo um momento bastante complicado. Os estádios históricos estão sendo destruídos para renascer em forma de centros de consumo e turismo, por vezes com jeito de shopping-center. Os ingressos dos campeonatos nacionais e estaduais estão cada vez mais caros, fora do alcance do torcedor ‘tradicional’. A média de público nos estádios está em plena queda”, analisa o dossiê do Comitê Popular.
A concessão do Maracanã, com a consequente demolição de praças esportivas essenciais como o Parque Aquático Júlio Delamare, o Estádio de Atletismo Célio de Barros e a consolidação do projeto olímpico na Barra da Tijuca são os principais fatores contestados pelo dossiê.
A chamada elitização do público do futebol também é destacada pelo dossiê. “Percebe-se um decréscimo de 732.160 torcedores nos estádios da primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol, entre 2011 e 2012, o que representa uma queda de 13%. Ao mesmo tempo, os custos dos ingressos subiram 9% e a arrecadação geral aumentou em 3%. Esses números podem indicar que menos brasileiros têm acesso aos estádios. Isso pode estar ocorrendo em função das obras, em andamento nos grandes estádios visando a Copa do mundo nas principais cidades do país, como é o caso do Rio de Janeiro”, aponta o documento.
Segundo o Dossiê, é possível analisar esse contexto como o de imposição de um modelo de futebol empresarial. Nele “estimula-se a venda do espetáculo aos ‘clientes’, que vão aos estádios para ter uma experiência de entretenimento e não uma participação ativa, identitária e afetiva com o evento. Sem dúvida, os números indicam que os que frequentam os estádios desembolsam cada vez mais dinheiro”.
Além disto, destaca-se também a destruição do legado do Pan-2007 pelo projeto das Olimpíadas de 2016 como ocorreu com o Velódromo, o Parque Aquático Maria Lenk e, mais recentemente, o estádio do Engenhão.
Meio Ambiente
O documento aponta que, apesar do discurso oficial afirmar veementemente a preocupação ambiental, na prática ocorre o inverso. A construção dos corredores viários Transcarioca, Transolímpica e Transoeste são alguns exemplos.
No caso do primeiro projeto, por exemplo, o dossiê critica o aterramento da lagoa de Jacarepaguá. Estavam previstos, para mitigar o efeito do aterramento, dois programas pelo estado do Rio: o Programa de Monitoramento da Fauna Existente e o Programa de Compensação Ambiental. Nenhum deles foi realizado.
Segurança Pública
“No Rio de Janeiro, que vem servindo de laboratório no tema da segurança pública, defende-se a necessidade de medidas extraordinárias de segurança. Mas cabe perguntar o que está sendo segurado, como, onde, e quais serão os efeitos de curto, médio e largo prazo das medidas que estão sendo adotadas”, pontua o dossiê.
Os fatos de a segurança durante os jogos ser feita por agentes privados contratados pela FIFA, bancados com dinheiro público, de o governo brasileiro pretender investir R$ 80 milhões em câmeras de vigilância nos estádios e não haver garantias de que as imagens coletadas pela FIFA sejam apagadas depois do evento, são criticados. O dossiê também vê essas ações como pretexto para aprofundar a mudança do modelo de segurança pública para o predomínio da segurança privada.
“Como um experimento para controlar as massas e extirpar ameaças, os megaeventos deixarão um saber governamental sobre as novas configurações da cidade. Esse saber não é neutro ou despolitizado, mas contextualizado dentro de um complexo cultural que identifica ameaças particulares que são socialmente construídas. A montagem do aparelho para proteger os interesses associados aos megaeventos pode ser adotada e utilizada para proteger os mesmos interesses pós-evento”, afirma o Comitê.
Informação e participação
O Comitê destaca ainda a negligência com respeito ao direito à informação e participação popular nos assuntos de interesse público durante os preparativos da Copa. Como exemplo, cita as remoções ocorridas nas comunidades Vila Harmonia, Recreio II, Restinga, Sambódromo, Campinho e Metrô-Mangueira. Todas as comunidades foram avisadas das remoções de suas casas algumas horas antes do despejo. E diz que não houve apresentação de justificativas plausíveis em grande parte das remoções nem os detalhes dos projetos foram publicados.
No aspecto orçamentário aponta também falta de transparência. “A divulgação de aumento de gastos frequentemente ocorre muito tempo após ter sido efetuado e, mesmo assim, nem todos os valores são publicados. No caso da preparação para os Jogos Olímpicos, há apenas uma estimativa inicial de orçamento constando no dossiê de candidatura, mas os gastos poderiam efetivamente alcançar quase o dobro dessa estimativa, segundo depoimento do presidente da Autoridade Pública Olímpica, em 2012.”
Orçamento e Finanças
O dossiê chama atenção para o valor total de investimentos para a realização da Copa do Mundo no Rio de Janeiro, que já sofreu um aumento de 95% tendo como base os valores da Matriz de Responsabilidades. Os R$ 2,2 bilhões previstos inicialmente tornaram-se quase R$ 4,2 bilhões. E contesta a informação de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro em 2016 custarão cerca de US$ 12,5 milhões, elencando 21 projetos municipais ligados, ao menos no discurso, às Olimpíadas cuja soma de orçamento alcança nada menos do que R$ 22,6 bilhões.
“Chama atenção o fato das decisões relativas a esses investimentos não passarem por uma ampla discussão democrática, envolvendo todos os segmentos sociais, colocando em pauta o projeto de cidade que está construído”, conclui o documento, criticando, mais uma vez, a concentração de investimento público em áreas nobres.

12 comentários:

  1. Como nosso país é envolvido pela corrupção nada mais “tradicional” do que ela está em grandes eventos como a copa. O que faz nos questionarmos a verdadeira direção dos benefícios que esse evento causará, e também a verdadeira direção que os malefícios irão tomar .
    Os mais de 20 bilhões que todos esses eventos (Olimpíadas, Paraolimpíadas e Copa do Mundo) irão nos custar não serão bem representados em benefícios para todas as demandas de nossa sociedade o que - em nosso país- o descarta de ser um evento democrático. Tantas necessidades em nosso país, talvez sediar eventos mundiais tão importantes assim não seria nem de perto uma solução para essas necessidades, ainda mais quando o interesse da minoria é posto em valorização.

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  2. Parece que voltamos a viver na época da Belle epoque quando as cidades eram feitas para a elite desfrutar e os menos favorecidos eram jogados em cortiços mascarando a realidade, assim querem fazer hoje colocar essas famílias em mini casas feitas apressadamente e com isso mal feitas acarretando riscos a esses moradores, sem falar no quanto de dinheiro está sendo gasto nesses investimentos ao invés desses recursos estarem sendo aplicados em setores básicos como,educação,saúde,emprego gerando qualidade de vida aos menos favorecidos

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  3. A partir da leitura deste artigo, podemos reafirmar o conhecimento da nossa triste realidade: o imenso descaso por partes dos governantes para com a população mais carente. É um absurdo constatar que, em pleno século XXI, observamos algo tão cruel com os direitos e deveres de cada um. Quem deveria estabelecer a ordem, o direito as necessidades básicas de cada ser humano, o privilegio ao necessário, são, na maioria das vezes, os primeiros que buscam o lucro e uma mascarização da realidade de seu próprio país. Infelizmente, precisamos conviver com essas situações. Mas, precisamos lembrar de tudo isso quando formos exercer o nosso direito de cidadania: o voto, o qual nos permite escolher as pessoas que realmente se importa com quem o elegeu.

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  4. Fazendo uma síntese, podemos perceber o quanto que esses megaeventos concentram investimento público em áreas nobres, enquanto que regiões que realmente necessitam não essa massificação de investimentos.O que acontece é essa falta de respeito aos direitos humanos, mostrado explicitamente no texto, em que fere diversos direitos do indivíduo, como os direitos sociais, civis,e etc.
    Diversas esferas públicas são afetadas, indo de encontro com a ideia de que esses megaeventos trariam benefícios para o desenvolvimento da população. Maria de Lourdes Manzini-Covre, em seu livro O que é Cidadania ,afirma que "quem detém o poder cuida de encaminhar as coisas na direção que atenda basicamente aos seus interesses, e não ao interesse de todos, apesar da aparência contrária". Isso é o que está sendo visto nessa preparação para a copa. Um gasto exorbitante de dinheiro público em prol de melhorias em áreas que irão atender a minorias.

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  5. O estado brasileiro encontra-se no mínimo desumanizado e desprovido de valores éticos. A elite dominante não se importa, nem um pouco, com o legado que tais eventos irão deixar no país.As únicas marcas que irão ficar são: maior segregação social e econômica, obras que beneficiam apenas uma elite e pouco ou nada melhoram a vida de uma população excluída. Como se não bastasse, um país que se diz democrático, mas faz uso de práticas como remoção compulsória de algumas comunidades; um país que afirma lutar pelo meio ambiente, mas não dedica sumárias atenções a tais obras, colocando em cheque , a credibilidade que tais eventos, poderiam realmente trazer benefícios um país como o nosso.

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  6. Fazendo uma análise, percebe-se o quanto os direitos do cidadão ainda não são prioridade do governo. O mais correto seria que houvesse um diálogo com a comunidade antes da execução de projetos como estes é fundamental para que o direito à moradia adequada seja respeitado. A comunidade, portanto, deveria conhecer com antecedência o projeto e a ela deve ser dada a oportunidade de apresentar propostas alternativas que visem evitar ou, pelo menos, minimizar as remoções, e o desrespeito com a comunidade.

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  7. Anniely freitas

    Podemos concluir que os interesses da população tem sido Negligenciado por parte dos seus governante.E recurso que deveriam ser aplicados a fim de promover um maior acesso a educação, cultura e lazer etc. tem sido desviados a fim de atender aos interesses da realização das obras para a copa ; construções que fulturamente não poderam ser acessadas por todas as classes sociais e sim apenas aqueles que tiverem melhores condições econômicas.

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  8. A copa do mundo é nossa! Mas quem somos nós? O que nós temos para ser algo? Temos o futebol, mas de que adianta nos identificarmos no esporte se alguns dos direitos fundamentais de grande parte de nossa população não são efetivados? Em seu livro A Democracia, Renato Janine Ribeiro diz que “A questão crucial dos direitos humanos é limitar o poder do governante” e que uma decisão não é democrática quando viola os direitos humanos, observando a atual política brasileira e mais especificamente as obras para a copa do mundo de 2014, podemos constatar que os direitos humanos são desrespeitados em todas as suas instancias, sejam elas civis, sociais, políticas, econômicas ou culturais; portanto, se os direitos humanos são violados, nossa democracia não é efetiva e, por consequência, temos uma republica insustentável, dessa forma, sem uma república verdadeira os direitos humanos não tem como serem garantidos e, portanto, nossos governantes têm seus poderes ilimitados. Creio que a partir desta pequena dedução possamos compreender um mal que está incrustado em nossa política: a corrupção em todas as suas facetas. Entretanto não pretendo discorrer sobre o assunto, já que ele não é o objetivo principal deste breve comentário, apesar de estar intimamente ligado ao assunto.
    Gostaria mesmo de falar desta violação de direitos que se processa durante as obras para a copa. Irei me ater à violação das três categorias de direitos que a autora Maria de Lourdes Manzini-Covre descreve em seu livro O que é Cidadania – civis, sociais e políticos. Começarei pelos políticos. Estes são desrespeitados, acima de tudo, na falta de transparência do governo quanto aos gastos com as obras, o atraso na informação das despesas e o impedimento da participação dos grupos sociais prejudicados pelas obras, como as famílias desapropriadas de suas casas. “Os direitos sociais dizem respeito ao atendimento das necessidades humanas básicas” (Manzini-Covre, M.L., 1995, p. 14), dentre estas, destaca-se a habitação. O Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de Janeiro afirma que milhares de famílias foram desapropriadas de suas casas para a construção de obras, sem depois receberem as condições necessárias para a aquisição de uma moradia digna, além do “desrespeito à cidadania através de ameaças, pressão e coação” para que as famílias aceitassem as propostas da prefeitura. No entanto, acredito que o maior desrespeito do governo está no que tange aos direitos civis, que “dizem respeito basicamente ao direito de se dispor do próprio corpo, locomoção, segurança” (Manzini-Covre, M.L., 1995, p. 11). Acredito que a maior violação a estes direitos está no quesito “segurança”, em que, quando o governo pretende assegurar esta, ele está, no fim das contas, criando um sistema de vigilância pautado em relações de saber-poder a fim de punir os corpos considerados como desviantes da ordem social que se quer, pois, como diz o texto do comitê: “Como um experimento para controlar as massas e extirpar ameaças, os megaeventos deixarão um saber governamental sobre as novas configurações da cidade”, através da implantação de milhares de câmeras nos estádios e afins, levando em conta “a percepção de um ponto singular em que o poder se exerce em detrimento do povo” (Foucault – Microfísica do poder, 1972, p. 135). Dessa forma, creio que o governo deva rever suas ações e perceber que, além de todos os gastos exorbitantes e da violação de direitos, já temos bastante circo, o que nos falta ainda é pão!

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  9. Vemos mais uma vez a privatização entrando em vigor, nossos governantes dão mais valor aos projetos que vão melhorar a vida dos mais ricos do que a vida dos mais carentes, onde está a nossa democracia? Que democracia é essa que fere os direitos humanos? Tiram pessoas de suas casas, pelo simples prazer de assistir um espetáculo e o pior, um espetáculo para poucos.
    O triste é saber que a culpa disso é nossa também, pois sempre valorizamos este espetáculo, “o país do futebol”, antes era orgulho denominar o Brasil assim, agora vemos que essa é só mais uma forma de nos enganar, para que nós não percebamos que o governo não investe no povo apenas na elite do pais.

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  10. Megaeventos podem revelar a contradição existente em uma determinada sociedade, uma vez que é interessante observar que um país que se diz democrático abusa de poder por parte de determinadas pessoas que ao invés de estarem realmente preocupados em cumprir seu papel profissional e social - como, por exemplo, nos cargos públicos - e assim além de crescer, desenvolver a sociedade em questão, não o faz como deveria.
    Descaso com a maioria que até tem meios de como se defender, mas não consegue muitas vezes, devido às próprias pessoas que deveriam servir a população conforme a lei, devido à corrupção desses "servidores" de direitos.
    E, ainda, frequentemente é vendida a imagem, no período das eleições, de um governo que faz suas obrigações, faz ações pelo seu povo, porém isso não se verifica de forma eficaz na realidade. Por exemplo, pode-se pensar que o Estado faz um benefício àqueles que são remanejados para as novas casas, construídas "especialmente" para elas, mas que podem esconder desvio de verbas com um falso orçamento, como o uso de materiais de construção ruins ou até mesmo vencidos que prejudicam o edifício, levando essas pessoas a correrem o risco de sofrerem graves ou até mesmo acidentes fatais.
    Os megaeventos geralmente escondem corrupção. Corrupção contra a população, contra seus direitos, direitos civis, políticos... que estão sendo, desde outrora, certamente negligenciados. Por fim, "O que dizer do atendimento desses direitos no Brasil, quando se sabe que a maioria da população se encontra em situação de clamorosa injustiça e pobreza?" (Manzini-Covre, M.L., 1995, p. 14.)
    Tudo que envolve os megaeventos precisa ser pautado e analisado por todos os envolvidos direta e indiretamente na situação - o que também não é feito, para esconder interesses privados.
    É importante que as partes mais afetadas lutem por seus direitos "(...), pois, se o poder se exerce como ele se exerce, é para manter a exploração capitalista." (Foucault – Microfísica do poder, 1972, p. 141.). "Mas se é contra o poder que se luta, então todos aqueles sobre quem o poder se exerce como abuso, todos aqueles que o reconhecem como intolerável, podem começar a luta onde se encontram e a partir de sua atividade (ou passividade) própria." (Foucault – Microfísica do poder, 1972, p. 141.)

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  11. Lorena Fernandes
    É nítido que as mudanças decorrentes desses megaeventos não têm nenhum comprometimento com o povo, mesmo com estes sendo os principais financiadores da estrutura e organização necessária para esses eventos acontecerem. Famílias remanejadas de suas moradias, infraestrutura mal distribuída e uso de dinheiro público para fins que não beneficiam o povo de maneira adequada são exemplos desse descaso.
    O povo brasileiro precisava de investimentos em educação, saúde e segurança. Isso de modo generalizado, já que existem outras especificidades. Enquanto é gasto dinheiro com demolição e reconstrução de estádios para seguir normas e padrões internacionais de primeiro mundo, que nem podem ser comparados com nossa estrutura, existem pessoas morrendo por não conseguir atendimento em um hospital público. A base deveria receber mais atenção.
    Levando em consideração que “saber é poder” o povo sem educação e massificado pelo estado e mídia, não tem tanto discernimento e informação suficiente, na maioria dos casos, para reconhecer o abuso e começar uma luta por seus direitos. Então, é conveniente ao estado, que o povo permaneça sem educação adequada enquanto eles fazem o que bem entendem com a “coisa pública”, desprezando o ideal democrático.

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  12. O Brasil, apesar de ser um país democrático, fere seu próprio caráter de democracia ao submeter suas leis a eventos como por exemplo a copa do mundo. É preocupante perceber que o país abre mão de regras constitucionais básicas para abrir portas aos projetos que são, em sua maioria, voltados apenas para atender os visitantes e atletas durante o período em que esses eventos que são exibidos mundialmente. Num exemplo como esse, pode-se perceber claramente o estado mobilizando a população em função de um projeto que tem como objetivo, não o bem maior, não um bem democrático, mas sim a distorção e um reparo rápido do ambiente urbano, para somente atender às exigências do evento.

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