segunda-feira, 15 de abril de 2013

"É preciso mais do que os mesmos discursos para mudar a situação"


Publicado em: http://www.conectas.org/

Uma morte choca, mais de cem vira índice. Como não oscilar entre euforia e depressão toda vez que a Secretaria da Segurança divulga a triste conta que a violência nos passou?

A cultura da agressão, policial ou não, como forma preferencial de resolver impasses na cidade ainda levará gerações para mudar. Até lá, consumirá muitos de nossos filhos.

Nenhum retrato fugaz dos números de homicídios, latrocínio, estupro, furto e roubo a banco é suficiente para capturar a essência do tempo em que vivemos -em que a cidade endurece em seu espaço público e em suas relações.

Precisamos de mais do que números para explicar o estado em que vivemos. Assim como precisamos muito mais do que os mesmos discursos de sempre para mudar.

A recente troca de cargos na Secretaria da Segurança afastou os temores mais imediatos de uma política criminosa de extermínio. O fim dos "autos de resistência", que mascaravam execuções cometidas pela polícia, também.

Há sinais de que as coisas podem mudar. Mas, para isso, são necessários passos ainda mais corajosos do poder público, como priorizar a investigação em vez de simplesmente lançar maus policiais em cima de pessoas "em atitude suspeita" nos bairros pobres.

E, quando tudo o que está à vista da classe média for feito, restará ainda o mais difícil: encarar de frente a violência oculta que atinge diretamente 500 mil pessoas no Brasil, 40% delas em São Paulo, que é a longa lista de crimes brutais cometidos todos os dias num sistema carcerário que discrimina, tortura, mata e não regenera ninguém, refletindo diretamente nesses números redondos apresentados ontem que, por piores que sejam, ainda assim, acredite, refletem o "menos pior" da nossa crueldade.

Marcos Fuchs é diretor-adjunto da ONG Conectas Direitos Humanos.

8 comentários:

  1. "Precisamos de mais do que números para explicar o estado em que vivemos" Por que hoje essa afirmação não parece tão lógica? É surpreendente a quantidade de pessoas que creem que as estatísticas podem explicar pormenorizadamente as grandes questões que nos assujeitam, a causa para o número de tantas mortes, as justificativas para o alto índice de miséria. Gráficos e suas interpretações precipitadas não são suficientes, pensar o con-texto se põe como tarefa primordial. Caso contrário, possibilitamos a emergência de mais violações, contribuindo com nossas práticas para o agravamento desse quadro já tão desolador.

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  2. O efeito imediato de repressão pela força parece ainda contagiar a cabeça da maioria das pessoas, estando elas ou não em cargos relacionados à segurança pública. Entretanto, hoje se criou uma necessidade de abrir mão desde efeito efêmero e aplicar estudos em efeitos duradouros, que possam promover a efetiva redução de casos como latrocínios e homicídios.
    A mídia exclama dia sim e dia não para nós como tem se multiplicado as ações violentas, assim como seus níveis de crueldade tem se tornado cada vez mais assustadora. Nas grandes metrópoles emergentes, como São Paulo ou Mumbai, a violência, mesmo a legitimada, ou seja, vinda de forças policiais ou militares, condiciona cada vez mais o comportamento de seus habitantes, fazendo-os terem medo de saírem de suas casas, sem a certeza de que regressarão as mesmas.
    E na maioria dos casos, a mesma violência é combatida com mais violência (a dita legitima) em uma associação que apenas gera um problema muito maior, perdendo-se também a idéia de que há inocentes e culpados, pois em uma sociedade onde a insegurança e a violência também são promovidas por quem deveria proteger, só cabe o papel de “vítimas de bala perdida” a todos.
    Muito mais do que apenas temer e repudiar a forma de combate a violência urbana do governo, a própria população deve buscar em si formas de alterar a realidade que fora construída e aceitas por todos. Sim, quando um pai bate em um filho como forma de manter o controle, a idéia de repressão é aceita, repetida e repassada para mais uma geração, levando a perpetuação do ciclo vicioso o qual vivemos.

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  3. Tais políticas de extermínio não apenas agravam e mascaram o real problema, pois apenas se preocupam com a eliminação do efeito e não da causa - como também alimentam dois mercados atualmente muito promissores - o do medo, e por consequência da segurança. Hoje, um cidadão não sabe a quem temer, pois qualquer um que esteja de bicicleta e usa um boné é um assaltante - assassino em potencial, e aqueles que apenas tem uma bicicleta e um boné ressentem-se por serem confundidos com bandidos. Isso gera medo, uma cultura do medo, em que todos se olham com estranheza na rua, apressam o passo para chegarem em casa. E esse medo gera ao excesso de segurança. Câmeras por todas as partes, grades de ferro em casa, carros com proteções de vidro. Ou seja, um problema que está na falta de educação, condições alarmantes de pobreza, uma saúde precária, escolas que não oferecem um ambiente saudável e que proporcione uma cultura da paz. Tal situação gera jovens e adultos alienados da "sociedade de bem", levando-os a buscar no submundo as razões de viver. E como o estado responde? Enchendo as ruas de policiais, promovendo políticas de extermínio a um grupo de pessoas que não tiveram o mínimo de estímulos que os colocaria fora da criminalidade, massacrando todos aqueles considerados subversivos, ou com um linguajar que foge aos padrões da língua portuguesa. E essa mesma população, agora mais marginalizada, se vê em um beco sem saída, depositando todas suas esperanças em uma prece ao sair de casa. E os de classe alta, acreditando-se vítimas - como se apenas eles, por terem maior poder aquisitivo, fossem a sociedade - reclamam e votam em políticos que a única coisa que fazem é colocar ainda mais policiais na rua. Em contrapartida, como dizem os antigos " melhor antecipar do que remediar", entopem suas casas e prédios com equipamentos de segurança. Essa indústria, por sua vez, apoia os políticos que só fazem colocar guardas e afins na rua. Fazem campanhas, e ludibriam os menos esclarecidos que dizem " dessa vez a coisa muda". E no fundo, a única coisa que lhe resta é a prece.

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  4. Atualmente, creio que haja uma seletividade quando se trata dos Direitos Humanos, simplesmente o termo "Humanos" é esquecido quando se trata de determinados indivíduos, geralmente aqueles de classes sociais mais baixas. Em seu livro Outsiders, Howard Becker dá um exemplo disso quando diz que é muito mais provável que um jovem de classe social mais baixa seja detido, indiciado e preso por algum ato do que um jovem de classe mais alta que provavelmente nem será responsabilizado mesmo que tenha cometido um ato mais grave.
    É possível ver claramente essa seletividade dos Direitos Humanos e essa preferência pelo uso do Direito Penal, este que deveria ser usado em último caso, quando não houvesse mais alternativas a serem analisadas e esse fato é um grande contribuidor para essa super lotação de um "cárcere seletivo" e o pior, não há políticas para a reversão deste quadro, o Estado não se importa com aqueles que estão presos e são de classes mais baixas e nem mesmo a sociedade que discrimina esses indivíduos.
    É necessário uma mudança na própria mentalidade da sociedade acerca destas pessoas, uma mudança no uso do Direito para que ele seja efetivo para que essa seletividade seja superada, só assim que o cárcere poderá adquirir seu papel ideológico principal, o de regenerar, cumprindo esse papel de forma igualitária e HUMANA pois não faz sentido esperar que uma pessoa tratada como bicho aja e tenha uma concepção humana da vida após sair desse cárcere desumanizador.

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  5. Todos os dias somos bombardeados por altos índices de violência e criminalidade.Chegamos ao ponto de nos tornarmos insensíveis a cada notícia que recebemos.Insensibilidade advinda do fato de que a violência é algo corriqueiro,que não nos choca,não causa mais espanto.
    A falta de ética profissional de certos policiais compromete a imagem da polícia como um todo,nos fazendo sentir cada vez mais inseguros e desconfiantes em relação ao órgão que deveria nos proteger.Nascem assim os "justiceiros de bairro",cidadãos comuns que praticam a violência com as próprias mãos em relação ao que eles julgam como injusto,contribuindo ainda mais para aumentar os níveis de violência urbana.
    Dessa maneira,nos resta esperar da segurança pública brasileira medidas dignas e condizentes de uma instituição de tamanha importância,que infelizmente,está cada vez mais desgastada e desprestigiada.

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  6. Todos os dias somos obrigados a ver através dessa imprensa sensacionalista casos de violência que ja nem nos sensibilizamos por ser algo normal que ja não nos choca mais.
    A falta de compromisso e ética de muitos policiais é cada vez maior, pois muitos saem por ai aplicando a força bruta sem saber se realmente estão "punindo" os verdadeiros culpados,como por exemplo eu fui a uma partida de futebol no estadio olímpico mangueirão e quando estava na fila para entrar um policial da cavalaria simplesmente sem motivo algum jogou o cavalo para cima de quem estava la inclusive eu quase me machuquei sem falar da falta de educação que ele tratou um senhor que foi reclamar, quer dizer ali fomos tratados como bandidos por pessoas que são mal preparadas e que pensam que por ter uma arma na cintura são os donos do mundo.

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  7. A mídia nos mostra todos os dias diversos tipos de violência, colocando o pobre, o negro, o jovem como os principais autores dela, o que ela não mostra é a verdadeira violência cometida contra eles pelo governo, são taxados de bandidos, mas só cometem violência por que sofreram violência.
    Os meios de comunicação mostram o que o governo quer que nós vejamos, que eles nos protegem da violência, não que eles são os primeiros a comete-la.

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  8. A mentalidade de extrema condenação é prejudicial. Todos os dias vemos notícias sobre violência, crimes e percebemos que há uma máxima onde "bandido bom, é bandido morto". Porém qual seria o sentido de termos cadeias e sermos um país democrático se essa é a máxima que rege nossas vidas? Em nosso país, por mais que um indivíduo busque a "redenção" de atos criminosos cometidos no passado, as nossas concepções sobre os criminosos são sempre direcionadas a uma condenação, mas mesmo que julguemos que os criminosos são só os estereótipos que temos em mente, crimes são cometidos contra os próprios presos e ex-dententos. Devemos repensar nosso posicionamento, pois como o título do artigo propõe, precisa-se de mais do que os mesmo discursos para mudar a situação.

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